DE ONDE OS RIOS SE ENCONTRAM PARA INVENTAR O MAR

Programa de Exposições do Carpe Diem Arte e Pesquisa – Palácio Pombal, Lisbon, Portugal

Curadoria: Lourenço Egreja

Descrição das obras

1 – Correr no azul à busca da beleza | 2014

Da observação do mar, e do sonho das bibliotecas perdidas da Antiguidade, surgiu este acúmulo de rolos de papel cobertos por diferentes tons de azul, numa alusão às infinitas cores e ao movimento incessante dos mares e oceanos.

2 – Para ler as correntes do oceano enquanto a chuva martela as janelas da casa | 2014

Já há alguns anos, ou talvez desde sempre, venho observando a praia e o mar de Boa Viagem, lugar onde nasci e onde ainda hoje me reconheço quando ali retorno, depois de uma partida de mais de trinta anos. Talvez por isso, interessam-me mais os dias de chuva, quando as nuvens cobrem quase tudo e a chuva martela, insistentemente, as janelas da casa, transformando a paisagem.

  • três vídeos com 10’, projeção simultânea em loop, edição de 5 + 2 PA
  • concepção e filmagem: Renato Bezerra de Mello
  • edição: Daniel Santos
  • EXPOSIÇÕES: ‘Entre céu e água’, Paço Imperial, Rio de Janeiro, Brasil
  • acesse aqui a página da obra

3 – Aparas | 2014

Do recorte de porções inúteis de folhas de papel guardadas em rolo, surgem espirais: um turbilhão de água que se forma no mar, no cruzamento contrário de suas correntes.

 Fotografia: Oxana Ianin

TEXTO

REABERTURA ÀS MARGENS DO TEJO

(Amateur d’art: par Lunnettes Rouges)

lunnettesrouges.blog.lemonde.fr

 

Depois da descoberta entusiasta do Centro de Arte Carpe Diem (que comemora seus cinco anos), eu voltei para a sua nova exposição (até 20 de dezembro): um espaço notável e exigente, que reivindica das obras expostas densidade, para fazer face ao espirito do lugar. De imediato, fiquei menos convencido por certas peças apresentadas, muito neutras ou extremamente leves e irônicas, enquanto outras, mais uma vez, souberam ocupar o espaço com nobreza e força.

Assim, Mafalda Santos construiu, no Salão de Honra, um muro feito de folhas de papel empilhadas, com discretos efeitos de cor fundidos nas suas bordas, e no jogo de luz do sol: há uma destruição, uma biblioteca em ruína, um monumento funerário ao papel, aos livros, um memorial de burocracias mortas. Há também uma escultura minimalista, um obstáculo de uma falsa leveza, enganador, que é preciso contornar, e em relação ao qual o corpo quer ser medido, em vão, imprimindo ali, por vezes, a sua sombra.

Na cozinha, há um trabalho de memória, um outro monumento com o qual nos confrontamos: aquático, marinho, flexível e convexo, de milhares de cores entre o cinza e o azul. Renato Bezerra de Mello, pensando no oceano que desde a sua cidade natal, Recife, o separa de Lisboa, acumulou centenas de rolos cobertos de tinta azul, empilhados sobre uma longa mesa. Dessa acumulação nasce um sentimento de beleza irrisória, de importância humana, e de nostalgia sonhadora, que fortalecem, dissimulados nos obscuros recantos da peça, três vídeos também marinhos, enevoados e úmidos.

Nesta exposição, também notei o interessante trabalho pós-colonial de Sandro Ferreira, e o jogo de palavras de Tim Etchells (bastante presente em Lisboa este ano), que acompanha uma série de fotografias de textos na cidade (grafites, slogans, …), feitas por jovens amadores, alguns muito talentosos.